segunda-feira, 26 de maio de 2014

Analfabeto.

Olá olá malta! Isto ao ritmo de um texto a cada 3 meses não vai lá mas... 
Vem esta (rara) aparição bloguístiqua a propósito disso mesmo, de escrever ou da dificuldade em o fazer. Como o sabem talvez, tenho andado ocupado com a Especialidade em Urgência e estou neste momento a meros 6 meses (isto o tempo é lixado, ainda ontem estava a penar em Lisboa e já faz mais de dois anos e meio que vim para cá!) do fim. Asseguro-vos que esta formação fez de mim um novo e melhor enfermeiro, mais eficiente, mais atento, mais responsável, mais capaz de cuidar dos meus doentes. Mas também me ensinou a melhor me posicionar face aos meus colegas, aos meus chefes e aos médicos. Na verdade, do ponto de vista meramente teórico, esta especialidade não me falou de nada que eu já não conhecesse mas o trabalho de revisão que ela me obrigou a fazer ajudou-me a evoluir, a revisitar conhecimentos que eu já possuía mas com um novo ponto de vista, mais maduro com 10 anos de experiência nos ombros. Foi como reler aos 35 um livro que já tivesse lido na adolescência. Enfim, o responsável da formação disse no primeiro dia: "Para ter sucesso nesta formação vai ser preciso que te desconstruas para te reconstruires", frase que eu retive na memória por ser bastante ilustrativa. Renascer das cinzas como a Fénix.
Tudo isto para chegar ao meu tema de hoje: a escrita. Escrever, para mim, sempre foi algo de muito natural. Um terreno de brincadeira onde as palavras são como peças que podemos juntar das mais variadas formas, onde a imaginação pode levar-nos longe, carregados de imagens, ambientes, emoções. Mas isso é em Português... 
Em Francês escrever é trabalho arqueológico, onde é preciso escavar para encontrar as palavras. É trabalho de detective onde se torna primordial descobrir as ligações entre as palavras, as frases, os capítulos. É trabalho de um investigador que reflecte, desfaz e refaz teorias e hipóteses. É duro e frustrante. Porque nada me sai naturalmente, porque sinto que utilizo frequentemente as mesmas palavras. Porque leio o que escrevi e não me parece bem. E isso é exasperante para alguém que até escreve mais ou menos! A primeira versão do primeiro capítulo que entreguei ao tutor do trabalho teve a seguinte apreciação: "as palavras estão aqui, mas não entendo o que queres dizer. Talvez isto faça sentido em Português mas em Francês não é claro.". E apesar de eu saber que sou Português, que por muito bem que eu  me exprima em Francês (e atenção que o faço muito bem) nunca o dominarei como a minha língua materna, aquilo feriu-me o orgulho, garanto! Caramba, é outro código de escrita, um conjunto de regras completamente novo e no entanto detestei ouvir aquilo. Acho que senti um pouco da frustração dos incontáveis colegas de todos os níveis de escola que tive que não sabiam escrever. E não gostei. 
Finalmente, como é impossível dominar uma língua estrangeira a um nível académico em poucos meses, envio os meus textos a um amigo suíço, jornalista que se encarrega de os rever, de os corrigir e de os embelezar. E depois de tratadas, aquelas palavras continuam a ser minhas mas impressiona-me como o texto soa muito mais belo, fluído e... bom!