terça-feira, 30 de março de 2010

O Livro Amarelo.

Não deixo de encarar o Livro Amarelo como um excelente indicador do nível de literacia e de formação cívica dos cidadãos que esta instituição serve. As pessoas não sabem escrever. A ortografia é deplorável e pobre, a caligrafia pueril (estou a ser simpático) e a construção do texto é inexistente. São pessoas de uma condição sócio-económica baixa.
Contudo, essa condição não é desculpa para o comportamento de alguns (muitos) utentes. Agressivos, ofensivos, ameaçadores. Lamento mas não tenho pachorra para isso. O que me enerva é que, enquanto essas bestas me chamam todos os nomes e mais algum e me ameaçam verbal e fisicamente e depois vão escrever (?) no livro amarelo, eu e os meus colegas temos que refrear os nossos impulsos mais primitivos de lhes fazer engolir os dentes todos (os que os têm) e de lhes pregar com os cornos numa parede, pois isso seria o fim da nossa carreira.
Se chamar a polícia é manifestamente exagerado numa situação dessas e os desgraçados dos agentes da autoridade já têm muito para onde se virar, não seria mal-pensado a criação de um livro amarelo dos profissionais onde pudéssemos explanar as nossas reclamações que, à semelhança das queixas dos utentes que são enviadas para o Ministério da Saúde, fossem remetidas ao Ministério Público nem que fosse só para chatear as bestas que prejudicam o funcionamento das nossas instituições. Teriam que responder À reclamação e ser ouvidas e, no decorrer do processo, talvez perdessem um ou dois dias de trabalho. Talvez assim pensassem duas vezes antes de insultar e ameaçar quem zela pela saúde da população.
Obrigado e bom-dia.

Taquicárdia.

Estava tudo calmo no serviço. Estou sozinho por causa da greve e, também por causa dela não há muita gente a vir. Preparava-me para fazer um pequeno curativo numa bebé quando ouço um dos médicos:
"-MIGUEL, MIGUEL! Temos um miúdo que ingeriu uma caixa de valium!!"
O rapaz terá uns 7 anos e dormita, choramingando, no colo da mãe que se desfaz num pranto.
O meu coração dispara e, com ele os meus movimentos apressam-se. Portas e gavetas abrem e fecham com estrondo enquanto reúno o material que vou precisar. Sinto a minha face tensa e não falo. Concentro-me no rapaz e na minha bancada de trabalho. Uma sonda nasogástrica já está colocada, a lavagem gástrica já está. O puto vomita. Ainda bem. Preparo o carvão que vai impedir que o estômago absorva ainda mais do medicamento e penso: preciso de uma veia. As auxiliares aparecem e peço o material para picar o rapaz. Um catéter, compressas com álcool, adesivo, um balão de soro e o sistema. A mãe cede ao stress e afasta-se. Apercebo-me que o miúdo está cada vez mais sonolento.
Tento picar uma veia. Ele sente a dor e afasta-se. Perdi a veia, rebentou. A mãe descarrega em mim a ansiedade. "ACALME-SE!" grito-lhe, e penso que talvez tenha exagerado no tom mas a situação é urgente. Ela acalma-se e volta ao choro compulsivo. Uma auxiliar agarra firmemente no braço do menino. Pico outra vez e ele foge. Calma. Está feito! Adesivo, soro a correr, o rapaz vai para a pediatria. Respiro. Passaram-se talvez uma dezena de minutos.
Há hora que vos escrevo tudo acalmou. Revejo a cena e recordo tudo. A cara do rapaz e da mãe, os movimentos das minhas mãos, as características do vómito, o cheiro, a expressão de desconforto do menino quando sentiu um tubo a entrar pelo nariz, a veia antes de a picar. Revejo agora tudo em câmara lenta, como se de um filme se tratasse. Na verdade, a adrenalina faz-nos captar tão mais informação em situações de stress. O filme acabou mas o meu coração ainda bate acelerado. É por isto que adoro trabalhar em urgência.

Loucura!

Que história fantástica de perseverança e coragem! Um pinguim sonhava voar. Pensava ele que, se os pinguins são pássaros e se os pássaros voam, então ele teria de voar e sentia-se injustiçado pelo mundo. E tentou de todas as maneiras mas voar não era algo que a sua anatomia lhe permitisse. Pediu então ajuda aos seu melhores amigos: um polvo azul meigo e disponível e a sua inseparável companheira, uma flor amarela com braços e perninhas fininhas que tinha um cachorro-quente de estimação.
Os três amigos juntaram-se para tentar cumprir o sonho do pinguim preto-e-branco e chegaram a uma solução: sopraram uma enorme bola de sabão que envolveu o pinguim e o levou pelos céus. O pinguim estava radiante! E lá foi ele a voar pelos céus. Mas o vento levou-o para longe e o polvo, a flor andante e p cachorro-quente lá foram atrás dele. Pediram ajuda à borboleta que esvoaçava por ali mas ela não pode ajudar. As abelhas também tentaram mas o pinguim era muito pesado. E ele lá foi, a pairar. Até que surgiu uma árvore de grandes galhos, que dava o seu passeio matinal e, sem querer furou a bola se sabão e fez cair o pinguim. O polvo azul, a flor amarela que anda e o seu fiel cachorro-quente apressaram-se a ir ver se o seu amigo estava bem. O Pinguim estava radiante, tinha voado!! E soube que, embora não pudesse mais voar, estava feliz com a sua condição...
Não, não é nenhuma trip de ácidos nem nenhuma esquizofrenia. Mas é como se fosse...)

quinta-feira, 25 de março de 2010

A Canção-Fétiche do momento.



Que grande banda!! E nem sequer é real!!

Projectos-de-Enfermeiro.

Quando eu era aluno de enfermagem, o que mais me fascinava e ansiava eram os estágios! A adrenalina de estar "onde tudo acontece", mexer nos materiais, observar os doentes, aplicar técnicas (por mais simples que fossem!), escrever nos processos clínicos, ter dúvidas e ir pesquisar e assim aprender! E como aprendia melhor no hospital do que na sala de aula. Tudo faz mais sentido, tudo encaixa melhor. E lembro-me perfeitamente da minha primeira injecção intramuscular, da minha primeira algaliação, entubação nasogástrica, da primeira vez que coloquei um soro, da primeira vez que toquei num cadáver, da primeira vez que assisti a um parto, da primeira vez que recebi um bebé na sala de partos e o limpei e cuidei dele e o pus aos berros! Lembro-me dos Enfermeiros que me levaram nessas curtas mas marcantes viagens. Uns pelas melhores razões, outros pelas piores. Mas recordo-os, não os seus nomes mas as suas caras e as situações que me ocorreram junto deles.
Eis que, alguns (não tantos assim!) anos volvidos, me vejo nesse papel de acompanhar estágios de alunos de enfermagem! Sim senhor, estou feito um homenzinho. Enfº Miguel, enfermeiro-de-referência (é assim que se denomina quem acompanha os alunos)... o que não deixa de ser estranho! Mas gosto! Em primeiro lugar obriga-me a ir rever matérias há muito enterradas, obriga a que estejamos muito concentrados no nosso trabalho e a fazer as coisas como deve ser! Depois porque gosto de falar, de discutir, de avançar através do debate. Confesso que gosto de partilhar as minhas experiências e de ver como elas podem servir para alguém mais novo evoluir.
Mas acima de tudo gosto de ver o brilho nos olhos, a excitação mal-contida, a alegria de um aluno quando, pela primeira vez, lhe é permitido picar uma veia, colocar um soro, algaliar. Nesse momento eu sei que, de uma forma ou de outra, eu farei parte da história académica daquele projecto-de-enfermeiro.

sexta-feira, 19 de março de 2010

Cuidado: este texto contém baba, muita baba!

Hoje é Dia do Pai. O meu filhote fez-me um bolo de chocolate com cobertura de natas com a frase "Feliz Dia do Pai" escrita com topping de morango. Fiquei muito mas muito contente! Brincámos aos palhaços, ás escondidas, aos sustos, com os carrinhos, fizemos uma tenda com um cobertor e as almofadas do sofá. Depois tive de vir para o trabalho e ele disse "Não quero que vás trabalhar papá...", "Mas tem de ser filho. O pai tem de ganhar dinheiro para poder comprar a tua comida, a roupa, os brinquedos.", "Então vou trabalhar contigo...". Brinco com ele mais um pouco e saio.
E venho no carro a recordar o sorriso dele, a sua alegria inocente e a sua vontade de estar comigo! A sua energia, criatividade e imaginação contagiam-me! A luz do seu sorriso é indescritível! "Orgulho" é o sentimento que melhor define o que sinto mas não é suficiente. Cada vitória dele é a minha vitória, cada palavra nova, cada salto mais alto ou mais longe, cada desenho, cada construção de lego ou de blocos de madeira são as minhas conquistas também!
A Mariana fez um vídeo delicioso onde o Gabriel me mostra o bolo que, tão orgulhosamente fez!, e faz uma pequena dedicatória (além de dar umas lambidelas no dito bolo!). Já vi esse vídeo dezenas de vezes hoje. Amo aquele miúdo incondicionalmente!
Por tudo isto simplesmente não percebo quando ouço histórias, como hoje ouvi, de pais que abandonam ou pura e simplesmente ignoram a existência de um filho. São os pai merdosos.
(Não seria justo não falar da Mariana já que, obviamente, foi dela a ideia do bolo e do vídeo! É a mulher da minha vida, uma esposa incrível e uma mãe fantástica! )

quarta-feira, 17 de março de 2010

Só pra Homens!

Há momentos na vida de um Homem que são definitivos. Marcam a diferença entre Homens de barba rija e meninos de coro. Definem toda uma vida. Ontem tive um desses momentos...

Era um dia normal, solarengo e divertido. Ao final da tarde fui correr como normalmente faço. O objectivo eram 10 km, sem pressas. Aquecimento, alongamentos, iPod a bombar e siga! Sentia-me bem, as pernas leves e soltas, o sol deu tréguas e havia uma leve brisa que ajudava a refrescar. Sabia que ia fazer uma bela corrida! Ao final de 2 km, ao chegar ao cimo de uma pequena colina e descendo em direcção ao vale, pareceu-me ouvir ténuamente um chamamento.... Miguel... Miguel.... Não liguei e segui em frente. Ao km 3º um chamamento inequívoco de alguém meu conhecido e que prima por aparecer nas alturas mais incovenientes. "Eh pá... não vês que agora não posso! Irra!!" e ele soprou e bufou, ameaçou e foi-se embora.
Km 4: cólica! O Sr. Intestino tinha urgência em colocar conversa em dia. "Miguel! Já sabes que eu não sou do tipo de ser colocado em espera..."
"Mas o que é que tu queres?! Vês por aí algum sítio em que possamos conversar em privado?!?! NÃO VÊS POIS NÃO??!" e segui no meu passo certo e firme em direcção ao objectivo inicial. Mas o Sr. Intestino cumpre as suas promessas e voltou logo depois à carga! Eu corri, aumentei o passo, apertei o que me foi possível apertar e tudo o que se ouviu dele foram alguns bufos furiosos. Fiquei feliz por estar a correr ao ar livre! "MIGUEL!! FALTAM-TE 4 KM! Não vais aguentar, nunca na vidinha pá!!"
"AH!! ISSO É O QUE VEREMOS!" e corri furiosamente. Ele lançou mais uma dos seus terríveis ataques abdominais e eu aguentei, estoicamente e como pude, os seus ataques! Suava em bica, mais pelo esforço de conter a diarreia verbal do Sr. Intestino do que pelo esforço da corrida... Faltavam dois quilómetros, pensava que ele tinha desistido da sua intenção de interromper a minha corrida quando ele lançou o seu ataque mais violento. Todas as minhas entranhas se revolveram e envolveram. Senti que perdia todo o controlo sobre os esfincteres que continham a verborreia intestinal. Procurei como um louco por um local que lhe agradasse... NADA!! "NÃO VÊS QUE NÃO HÁ ONDE CONVERSARMOS?? ISTO É UMA ZONA RESIDENCIAL, PORRA!!!", "Quero lá saber..." foi a sua resposta.
Respirei fundo, apelei a todas as minhas energias e aumentei o passo. O último quilómetro foi uma tortura. A sua voz na minha mente, eu concentrado nos músculos das pernas e na música, aumentei o volume para o máximo. "Pernas e música, pernas e música, pernas e música..." pensava enquanto me aproximava da minha casa. Lá estava o portão!!
"Miguel, vou sair! Vou mesmo sair!!!"
"ESPERA UM POUCO PÁ! JÁ FALAMOS, SÓ MAIS UNS METROS..." o tom era de súplica nesta altura. As minhas pernas já não tocavam no chão, a estrada já não existia, a dor foi-se. Só existia a força para o conter, a sua voz na minha mente e o portão da minha casa. Cheguei finalmente, sei que saltei o muro mas nem me lembro como o fiz, irrompi pela casa, a Mariana assustou-se e o Gabriel riu-se.
"MIGUEL VOU FALAR!!" mesmo a tempo, cheguei... "PODES FALAR AGORAAAAHHHHHHHHHHHHHHH!"
(Para que conste, fiz o objectivo, 10 km, no tempo mais baixo até agora e num ritmo muito bom! Obrigado pelo incentivo Sr. Intestino!)

Génios.

Hoje, durante mais uma corridinha, relembrei um dos álbuns que mais marcou a minha juventude e, por consequência, o meu primeiro verdadeiro Ídolo. "Nevermind" dos Nirvana marcou toda uma época e toda uma geração. Tudo nele era (é!) revolta, raiva, melancolia, desesperança, desespero e o título do álbum resume todo o sentimento de um homem: Kurt Cobain. Li algures que um filme vai retratar a sua curta vida. Acho bem, vou ver. E hoje, ao ouvir novamente músicas que estavam arrumadas numa gaveta na minha mente, os sentimentos que elas me causavam há quase 20 anos (!) voltaram! E então percebi: nunca serei um génio. A melancolia não mora em mim.

segunda-feira, 15 de março de 2010

Palavras para quê?

Miguel e Gabriel, Praia de Sesimbra, final de uma tarde solarenga.

quinta-feira, 11 de março de 2010

Prenúncio.

Cada vez mais me apercebo que, do todos os sentidos que são estimulados por aquilo que faço, aquilo que vejo, aquilo que toco, o cheiro é de longe o que mais me marca. O cheiro a fezes e a urina, o cheiro do sangue, o cheiro do pus, o cheiro das feridas infectadas. E também o cheiro do éter (claro!), do betadine, dos desinfectantes das mãos, da carne cortada pelo canivete laser, do café que me mantém acordado numa noite como esta.
Mas há outro cheiro que acabei de sentir e do qual nunca me libertarei. Acabei de sair do quarto de uma doente. Paliativa, sem retorno. O quarto está ocupado por um cheiro intenso, não muito forte, mas presente. Fezes não, a senhora está limpa. Urina também não. Nem vómito, nem feridas. O cheiro não abandona o quarto através da janela aberta. Conheço este cheiro, não o sei definir mas sei quem ele anuncia.
Terei companhia esta noite?
(o tom tem sido mórbido nos últimos textos mas a vida, a morte?, tem sido particularmente cínica nos últimos dias)

quarta-feira, 10 de março de 2010

Curtir a vida.

Eu tenho o prazer de trabalhar com colegas da minha faixa etária. Naturalmente que teremos alguns interesses em comum mas, acima de tudo partilhamos a jovialidade com que encaramos o dia-a-dia dentro de um hospital. Contudo, há um aspecto que nos separa: o compromisso. Enquanto eu tenho um compromisso com a minha mulher e com os meus filhos, a maioria dos meus colegas tem apenas um ligeiro compromisso com um(a) namorado(a) o que, convenhamos, não é bem a mesma coisa. Eu costumo dizer que a única coisa que se perde com a chegada dos filhos é a espontaniedade. Isto no sentido em que não podemos simplesmente decidir que vamos viajar amanhã sem ter qualquer outro tipo de preocupação!
Acontece que os meus colegas, solteiros e maus rapazes, têm uma ideia completamente contrária à minha e, alguns (admito que inconscientemente) até criticam de uma forma mais ou menos subtil esta minha escolha de casar e ter filhos. E isso nota-se em algumas expressões ou suposições que não correspondem exactamente à verdade. Partem do princípio de que "não curtiste a vida", ou que "ter mais um filho piorar ainda mais a tua qualidade de vida" ou ainda "se algum dia te divorciasses irias curtir tudo o que não curtiste até agora". E isto são só alguns exemplos! Parece-me evidente que, para eles o factor "curtir" é decisivo na sua filosofia de vida. Claro que "curtir" é sair todas as noites e passar fins-de-semanas com amigos na mais perfeita descontracção. Nada contra.
Embora não concorde com eles e lhes tente fazer ver que as escolhas de cada um são isso mesmo, de cada um, não tento sequer descrever-lhes o que é "curtir" um filho. Porque isso não se descreve, sente-se! E, mais uma vez, cada um sente à sua maneira.

terça-feira, 9 de março de 2010

E eu sou um gajo que cora facilmente!

Eu utilizava um urinol de um WC de uma grande superfície comercial. O Gabriel ao meu lado.
-Papá? 'Tás a fazer xixi?
-Sim filhote. Também queres?
-Não... quero ver a tua pilinha!
(sorrio e quando me preparo para dizer algo...)
-QUERO MEXER NA TUA PILINHAAAAAAAAA!
(sinto o calor a percorrer-me o corpo e a cara prestes a explodir! Digo...)
-Oh filho, mexe na tua que também é gira.
(depois calo-me, lavo as mãos rapidamente e retiro-me do WC com os olhares de todos cravados nas minhas costas e penso...)
-Eu e a minha grande boca.

segunda-feira, 8 de março de 2010

E só para reforçar o texto anterior, sobre invejas e guerras femininas e de como as mulheres que hoje são muito amiguinhas hoje, amanhã são umas cabras ressabiadas e violentas, hoje encontrei isto! Será que as unhas de gel e os sapatos de salto alto afectam a sanidade mental destas tipas?

Ora então, Um Feliz Dia da Mulher a Todas!!

Neste Dia da Mulher optei, num altruísta acto de solidariedade com as Mulheres de todo o mundo, por escrever algo relacionado com a Mulher. Uma singela homenagem, vá. E assim, imbuído do espírito que consagra este dia, hoje remeto-me ao tema: Porque Raio São as Mulheres Tão Cabras Entre Elas No Local de Trabalho?
Trabalhando eu num meio onde a mulheres são a larga maioria, tendo trabalhado durante anos numa equipa onde eu era o único homem e tendo já alguma experiência na chefia de uma equipa de 14 mulheres julgo conhecer bem esta realidade! Pois que é conhecido de todos que, em trabalho onde há muitas mulheres há sempre problemas! E são muitas delas que o dizem. E eu também. Da minha experiência, o que se passa é que existe muita inveja entre elas. Inveja do horário da outra, da roupa da outra, do telemóvel da outra, do carro, da maquiagem, das unhas, do cabelo da outra. Se uma delas se arranja é uma oferecida, se pelo contrário é demasiado discreta é sonsa! Se é simpática com os (poucos) homens do serviço é uma oferecida mas se não fala com ninguém tem a mania que é boa!! Enfim, o meu local de trabalho é um terreno minado de intrigas e falatório, de alianças e traições, de amizades fingidas e inimizades fidagais onde qualquer homem tem de conhecer bem o terreno onde pisa, sob pena de se tornar num dano colateral do fogo cruzado entre as várias facções em batalha! E nem sempre são só duas!!
Havia na minha turma da faculdade, um grupinho de 5 raparigas que andavam sempre juntas. Eram "irmãs" inseparáveis, segundo as próprias e estudavam juntas, ajudavam-se mutuamente, estavam sempre lá para aquela menos afortunada. E nós, os gajos, apostávamos sobre quando a guerra iria instalar-se... Aconteceu no último ano com a perspectiva do final de curso e das notas de conclusão de cada uma! Pois que uma delas usou, digamos, técnicas de diplomacia feminina (e fica ao vosso critério perceber o que isto quer dizer...) para subir uma ou outra nota junto de um ou outro professor mais, digamos, vulnerável à persuasão feminina. As outras uniram-se contra esta e esta aliou-se a outras e, no fim, não restou pedra sobre pedra!
E, não há muito tempo, assisti a uma mulher mais velha e mais diferenciada a humilhar uma estagiária apenas porque o Chefe elogiou o trabalho desta última! E aqui temos a principal causa de inveja entre as mulheres: os homens! Seja o Chefe ou apenas um homem que trabalhe com elas! Calculo que, com a escassez do género masculino nos locais de trabalho, o sentimento territorial e de posse das fêmeas face aos poucos machos que existem esteja exacerbado! E elas tornam-se umas verdadeiras leoas a proteger o que é "seu"! Porque é disto que se trata: dos homens "delas"! E só há uma coisa que pode quebrar os laços entre duas "melhores amigas" e essa coisa é um homem!!
Neste dia da Mulher gostava de apelar a todas para manterem estas intrigas e guerrinhas! É que para nós, a pequena maioria masculina, é um verdadeiro manancial de riso e brincadeira! E não há nada mais divertido que lançar contra-informação que abale o (precário) equilíbrio que existe no campo de batalha!

quinta-feira, 4 de março de 2010

Tinha alinhavado um belo texto, simultâneamente ternurento e engraçado para revelar o sexo do bebé que ainda cresce (e bem!) dentro do ventre da minha bela e gravídica esposa mas enfim... prefiro gritar aos sete ventos...
É UM RAPAZ!!!!!!

quarta-feira, 3 de março de 2010

Momentos Ally McBeal ou Na Volta Isto é Uma Esquizofrenia.

Lembram-se da Ally McBeal? Eu adorava aquela série, aqueles laivos de loucura esquizóide e non-sense! Mas o que mais gostava eram aqueles momentos em que Ally ou alguma das outras personagens tinham aqueles memoráveis momentos what-if? em que o mundo era uma canção com os personagens divinamente coreografados ou uma momento de realidade alternativa onde, em vez de se retirar após ser insultada, Ally espeta um grande murro nas trombas de alguém! Eis que finalmente reconheço perante o mundo que sofro do Síndroma Ally MacBeal. Triste, mas verdade.
Já descrevi um desses momentos aqui mas hoje ocorreu-me um outro. Descia no elevador do hospital quando este para e entra uma enfermeira e uma auxiliar acompanhando um doente acamado. A porta do elevador fecha-se e.... O HORROR, o elevador encrava entre pisos. Dentro dele estava eu, duas visitantes, uma enfermeirinha novinha com aspecto de ser recém-formada em pânico, uma auxiliar petrificada e um doente com aspecto de estar mais-lá-do-que-cá. Olhei para a cama do doente e percebi: nada de material de reanimação! A minha colega gaguejou que o doente estava mal e está a caminho dos Cuidados Intensivos. O filme fez-se na minha mente....

"-Oh não!! O doente parou!! E AGORA?

(salto para cima do doente e inicio manobras de reanimação) Vai miúda! Iniciar respiração boca-a-boca! Nada desse esgar de nojo, é uma vida humana pela qual somos responsáveis! (continuo a "bombar" no doente) Sra. Auxiliar, pegue no meu telefone e ligue para o nº do hospital que encontrará na lista. A menina assustada aí ao fundo, carregue no botão de alarme e não o largue! E você meu caro doente, hoje não é dia de morrer... não no meu turno!!(as portas abrem-se e enquanto a enfermeira empurra a cama eu mantenho as manobras. Quem observa a cena entoa cânticos de motivação: MIGUEL, MIGUEL, MIGUEL!! Chegamos às portas dos Cuidados Intensivos, o doente reanima-se...)

-Obrigado Sr. Enfermeiro... salvou-me a vida!!

-Obrigado Enfermeiro Miguel... (diz a enfermeira)

(dirijo-me de volta ao elevador e todos louvam a minha acção) Não foi nada! É só o meu trabalho!!

O elevador reinicia. As portas abrem-se. Passaram-se cerca de 2 minutos.

segunda-feira, 1 de março de 2010

Os tempos até podem mudar...

Hoje, enquanto passeava com o Gabriel no parque, observava um grupo de adolescentes que ali se juntara. Seriam uns 20, entre rapazes e raparigas. Um deles tinha as calças cheias de lama, provavelmente de uma das poças de lama espalhadas pela relva do parque. Alguns deles incentivavam-no a ir sujar as miúdas sentando-se em cima delas e ele ia. Elas afastavam-se com os gritinhos típicos destas raparigas e com um sonoro "PARVO!" mas uma estava claramente a pedi-las! Se eu vi, ele melhor ainda e, quando dei por eles andavam a rebolar-se agarrados na lama! "Enfim, miúdos parvos..." pensei.
Mas, eis que me ocorre o seguinte: eu também já fui adolescente! E olhei melhor para aquele grupo. E estavam lá todas as figuras de que me lembro, dos meus dias de teen. O palhaço (aquele que andava na lama) que diverte o resto do grupo, o intelectual de óculos e um pouco marginal à acção, o bonitão rodeado de miúdas, o freak todo vestido de preto e com os phones enfiados nos ouvidos, a gorda que é amigo de todos mas que nenhum rapaz cobiça e a sua melhor amiga, a boazona convencida que julga ter todos os rapazes na mão, as três miúdas que nunca se largam nem ao telemóvel, os jogadores de futebol, os dreads, os skaters. E tentei lembrar-me das profundas reflexões metafísicas que escrevia no diário, das profundas conversas á volta do significado de "Metamorfose" do Kafka, do cortejo romanceado às raparigas, das festas na piscina com DJ e nas observações da lua dentro do meu descapotável. Mas logo me apercebi que estas lembranças vinham de tantas e tantas séries sobre adolescentes norte-americanos! Na verdade só me lembrei das borbulhas na cara e nas estúpidas técnicas de engate que incluíam bilhetinhos escritos com traduções rascas das letras do Kurt Cobain, de ser expulso das aulas por estar constantemente a rir feito parvo e a gozar com os colegas e a imitar os relinchos de um cavalo, de entrar no WC das mulheres e ser corrido à vassourada pela empregada da limpeza, das cenas porno-softcore nos corredores do liceu com a miúda que já toda a gente tinha apalpado, de ignorar essa miúda depois, de tossir como um doente cada vez que tentava fumar um cigarro e de manter a pose com ele aceso sempre que passava uma rapariga, das ridículas botas bicudas "à cowboy" que usava, das calças rasgadas e nojentas, de usar sempre os mesmos ténis "All Star" verdes mesmo quando chovia a potes e de ter estado de luto durante dias após o Cobain ter decidido provar uma bala directamente do cano da arma, de andar a tocar a todas as campainhas da terra durante a noite, de tocar o sino da igreja a rebate de madrugada, de entrar no cemitério cagado de medo só para impressionar e de não ter a mínima ideia de como satisfazer uma mulher e achar que era um verdadeiro Eros.
Depois disto só posso concluir uma coisa: os adolescentes são parvos por definição. Seja em que época for!