Tenho problemas com as "meias palavras". Aliás, nunca concordei com o velho ditado popular "para bom entendedor meia palavra basta". Sou mais de acordo com uma outra velha expressão: "Chamar os bois pelos nomes" (é engraçado como há velhos ditados populares que se contradizem mutuamente!). E sou assim porque gosto das coisas clarinhas como água. Gosto de saber exactamente o que é esperado de mim, da mesma maneira que gosto de dizer exactamente o que pretendo ou como me sinto. Afinal, a nossa Língua é tão rica em vocábulos que não faz muito sentido que haja "zonas cinzentas". Mas, suprema ironia, apesar de tão enorme riqueza de vocabulário, o Português é exímio em construir um discurso cheio de subterfúgios, de expressões de interpretação dúbia, de entoações subtis que podem ser entendidas de muitas formas pelo destinatário e de "meias palavras".
O problema das "meias palavras" é esse mesmo: não são objectivas! Na verdade "para bom entendedor meia palavra basta" é uma mentira. Isto só é verdade quando quer o emissor quer o receptor estão no mesmo contexto. É um pouco como as private jokes, só aquelas pessoas que estão dentro do contexto sabem exactamente o seu significado. No mundo real, laboral, o zé portuga utiliza as meias palavras como um meio de defesa. Mais tarde, quando confrontado com um "você disse isto", o portuga rapidamente responde "nãããão, eu nunca diria uma coisa dessas! o que eu disse foi aquilo. Você deve ter percebido mal." E pronto, acaba-se ali o argumento. E eu, que gosto de argumentar fundamentado, nas minhas discussões, não suporto bate-bocas em que se discute o que se disse ou que se disse que se disse.
Por isso, normalmente, eu não compro guerras pequenas e acessórias (ou seja, a maioria das discussões que surgem no trabalho!), não discuto assuntos que sejam de alguma forma acessórios, não entro em debates sobre se aquilo que foi dito significou aquilo que foi realmente dito ou se, pelo contrário, alguém percebeu o que foi dito pelo que não foi dito. Fiz-me entender? Cá está "fiz-me entender", uma expressão que utilizo muito. Porque nas discussões que se arrastam, é muito comum um dos intervenientes usar a frase "você não me está a entender". Isto é sintomático: parte-se do princípio que o problema reside no outro.
Tudo isto para explicar algo que algumas (muitas) pessoas identificam como algo que me define: raramente entro em discussões mas quando entro sou muito... apaixonado, digamos! Já me chamaram desde "violento", "agressivo" passando por "anormal" ou "estúpido". O que se passa na verdade é que eu gosto de usar as palavras certas para definir as coisas. Por exemplo "incompetente" em vez de "distraído", "mal educado" em vez de "tem um feitio especial" ou "mau feitio", "arrogante" em vez de "superior", só para citar alguns exemplos. E já tive alguns problemas com isso...
Resumindo, acho que estas meias palavras devem ser guardadas para as relações pessoais, deixando as relações profissionais apenas com o discurso directo e objectivo. E como, cada vez mais, o nosso dia-a-dia laboral está cheio de "políticos" com um discurso cheio de rendilhados mas objectivamente vazio, cada vez menos entro em debates. Porque não gasto nem o meu tempo nem o meu latim em discussões do peido.
2 comentários:
Tb não entro em discussões por meias conversas.
Até nisso tenho mau feitio, ou bem que vale a pensa ou então...ouço e calo.
Miguel, deixa-me dizer-te: como te entendo. Até mesmo nas relações pessoais, quando um dos dois não explica exactamente aquilo que pretende, pode dar origem a problemas. Nas profissionais então -e mais ainda numa profissão como a tua- um simples "erro de interpretação" pode ser a causa de algo bastante grave. Eu gosto de dizer as coisas claramente, às vezes repito-as várias vezes até ter a certeza que a outra pessoa percebeu exactamente o que quero. O que lhe custa a muita gente é aceitar que eu não consigo levar a cabo seja o que for se não mo transmitem claramente. Às vezes devem achar que sou lento de raciocínio, mas a verdade é que não gosto de deixar lugar às tais "zonas cinzentas" de que falas. O tempo ensinou-me a proteger as costas...
Um abraço.
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