O referendo de domingo tem dado pano para mangas por estes lados e vejo que também tem tido alguns ecos por aí. Enfim, há coisas que são efectivamente correctas mas outras nem por isso.
O resultado de domingo mostra que a democracia directa também não é perfeita. Neste caso deve salientar-se que a abstenção cifrou-se em 47% e que a proposta foi aprovada com 50,3% dos votos. Ou seja, apenas metade da população votou e o "sim" ganhou com apenas cerca de 19000 votos a mais. Depois, quando se analisa os resultados compreende-se que as cidades mais importantes do país, ou seja Genebra, Zurique, Lausanne e Berna votaram contra. O Governo manifestou-se contra, assim como todas as associações de patrões e trabalhadores, sindicatos e ordens profissionais. Foram as zonas rurais, mais conservadoras e onde há menos imigração e logo onde o imigrante é um bicho-papão, que aprovaram esta lei. Por isso choca-me que digam que os suíços são xenófobos. Há efectivamente uma grande parte de suíços que o são mas a maioria não o é de todo. Depois, a campanha do partido de direita que fez a proposta baseou-se sobre pressupostos que não são verdadeiros (os imigrantes prejudicam o país, consomem recursos e não contribuem para a economia logo a culpa da crise é deles!) e que em conjunto com o medo de uma recessão económica que aqui é quase patológico mesmo se a economia não pare de crescer e com a constante presença na comunicação social de histórias de crime praticados por estrangeiros, dá estes resultados.
Mas não é de hoje. Quando aqui cheguei há mais de 2 anos, a primeira imagem que tive ao sair da Gare de Lausanne com as malas ás costas e os meus filhos pela mão foi a de um enorme placard com imagem de soldados e chaimites onde estava escrito com letras garrafais: "STOP À IMIGRAçÃO MASSIVA". E nestes dois anos a Suíça foi efectivamente invadida por estrangeiros de todo o lado. Dois anos de campanha desonesta de direita dá nisto.
Contudo e apesar destes factos, a atitude de quem perdeu é de salientar. O Governo apressou-se a dizer que o povo é soberano e que apesar da decisão ir colocar o país em dificuldades face á UE, é a sua função de encontrar soluções. Os outros partidos não condenaram os povo, apenas chamaram o partido impulsionador de iniciativa ao seu dever, o de ser parte principal na proposta de medidas concretas. Os suíços comuns com quem trabalho e que encontro na rua que votaram contra dizem simplesmente que apesar de não estarem de acordo, o povo é soberano e cabe ao governo negociar com a UE, acrescentando ainda que a Suíça não pertence á UE e que cabe também aos europeus vir ao encontro do povo suíço. É o orgulho helvético.
Por isso e apesar de ser desconfortável para nós imigrantes um resultado como o de domingo, sabemos que as consequências desta votação serão sentidas principalmente pelas empresas e pelos estrangeiros que queiram vir trabalhar para a Suíça. Mas os suíços também sabem que o país que é deles nã funciona sem nós. Em todos os sectores da economia suíça como a restauração, o turismo, a saúde, a construção, os serviços a percentagem de trabalhadores estrangeiros ultrapassa largamente a dos suíços. Aqui no meu serviço os suíços são menos de 30% do total de enfermeiros e no hospital em geral eles encontram-se sobretudo na administração.
É pena o resultado desta votação porque dá argumentos aos partidários de direita mas há 10 anos atrás as fronteiras suíças estavam fechadas e sempre houve estrangeiros neste país e, sobretudo, estrangeiros contentes com a sua situação neste país.
2 comentários:
Sou um bocado obrigada a concordar com o que disse um eurodeputado francês... que a Suíça não pode querer ter os benefícios de fazer parte do espaço Shenghen, e recusar a parte do acordo que não lhe interessa...
Foi bom ler esta visão de quem está mais próximo dos acontecimentos.
Efectivamente Naná, estou completamemte de acordo contigo. Aliás, quando confrontado com a surpresa por parte de alguns colegas pela reacção dura da UE é isso que lhes respondo!
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