terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Olha... calhou!

Trabalho e trabalhei com muitos Enfermeiros. Uns bons, outros nem tanto, alguns excelentes com quem aprendi muito e outros não tão bons tecnicamente mas com um sentido de relação humana tão apurado que sabem perfeitamente o que dizer (ou não) ao doente em deteminada situação.
Eu não sou nenhum dos anteriores. Contudo existe um grupo dentro desta imensa classe que me faz comichão, e que quanto a mim só vem inquinar a qualidade dos profissionais. Falo dos "Dr. Enfermeiro". Esta malta sempre teve o sonho de, um dia, vir a ser médico. Como não conseguiu virou-se para o parceiro natural dos médicos, os enfermeiros. A bosta é que as funções e a abordagem ao doente são completamente diferentes. Radicalmente diferentes. Só para terem uma pequena ideia, enquanto que a medicina aborda a problemática partindo da doença, a enfermagem aborda o mesmo problema do ponto de vista do doente.
Então falava eu dessas alminhas penadas que são os "Dr. Enfermeiro", e tratam-se efectivamente de almas penadas pois não pertencem verdadeiramente a nenhum de dois mundos: nem ao dos enfermeiros porque se afastam, nem ao dos médicos, aquele mundo que eles almejam. E isto de ser enfermeiro não é fácil. Somos a plataforma sobre a qual roda todo o processo de cuidar do doente, temos que mediar a relação do doente com os outros profissionais (principalmente com os médicos), temos de estar sempre atentos porque é a nós que o doente pede sempre ajuda, mesmo que de forma mais camuflada.
Aqui surge aquela que é para mim, a característica mais importante num enfermeiro: saber exactamente qual é o seu papel e os limites da sua actuação. Demasiado vago? Pois...
No meu primeiro dia no curso perguntaram-me porque tinha ido para enfermagem. Resposta: porque calhou! Assim, sem rodriguinhos! As circunstâncias assim o proporcionaram e ainda bem. Dessa forma encarei o curso sem preconceitos, sem falsas expectativas e hoje penso que sou um bom enfermeiro por isso. Tenho dias em que gostava de fazer outra coisa, trabalhar com gente doente pode ser muito deprimente. Gostava de fazer algo onde pudesse falar com muita gente, de diferentes línguas mas num ambiente mais leve. Mas, no geral, gosto do que faço.
Tenho apenas uma certeza: não trocaria nunca o meu papel e as minhas funções pelas do médico (e daí, talvez considerasse trocar apenas os ordenados!)
(Eu nem gosto de escrever posts assim, muito específicos. Mas acabei de me cruzar com uma aventesma do grupo acima descrito bajulando declaradamente o Exmo. Sr. Dr.... Asco... desculpem o desabafo.)

9 comentários:

rosemary disse...

OH, como sei do que falas!!!
Mas quem fala de Drs Enfeirmeiros, também fala de Drs Dietistas e Drs Nutricionistas e por aí fora!
Existe sempre indivíduos no ramo da saúde que por não conseguirem entrar em medicina, foram para enfermagem ou qualquer outro curso de tecnologias da saúde. Depois tornam-se profissionais sem paixão pelo que fazem, nem vontande de ajudar...
Existe muito disso na minha área, nota-se como ficam "inchados" quando lhes chamam de Dr.!
Bjs*

S* disse...

Uma pessoa tem de se sentir satisfeita no seu papel senão vai ser um eterno frustrado.

Mas a verdade é que há muito essa ideiazinha parva de que os enfermeiros são os aspirantes a médicos. Parvo. muito parvo.

Anónimo disse...

E os Drs DENTISTAS? Não concordo com tudo o que está escrito mas os Drs DENTISTAS são demais! E os Drs PSICOLOGOS? xii

Banita disse...

Eu escolhi a enfermagem por ser o mais próximo de Medicina, mas feliz ou infelizmente, acabei na Engenharia! Se tenho pena de não ter entrado? Quando entro num hospital tenho muita pena, pois identifico-me com o espaço, sinto-me bem nos hospitais. Adoro sentir o cheiro a éter!
Se ficar longe dos hospitais, os dias passam sem que pense nisso.
E discordo da Sanxeri, não é parvoice, há muita gente que não conseguiu entrar em medicina e escolheu a enfermagem pela proximidade. São opções. As duas profissões são bonitas.
Se ser médico não tivesse tanto estatuto, nem tão bom ordenado, havia muita gente a escolher enfermagem e outras profissões!
Quando era adolescente ouvi uma conversa entre duas mães que me chocou. Dizia uma para a outra: Se o seu filho tem tão boas notas ele devia ir para Medicina!
Porquê? Isso significará que ele vai ser bom Médico? Óbvio que não!!! Mas vai ganhar bem e ter estatuto!
E eu para não ter problemas na velhice, quero ter 3 filhos: uma Médica, outro futebolista e o (a)outro (a) ainda não me decidi, mas tem de ser qq coisa em que se ganhe bem, porque a vida não está fácil e com a reforma que vou ter, preciso de alguém que me sustente! LOL

Ana C. disse...

Farto-me de pensar nisto que escreveste. Não só em Enfermagem/Medicina. Mas em todas as outras profissões. São cada vez menos as pessoas que trabalham com verdadeira vocação, com humildade e sem arrogância. Por isso temos tão maus profissionais.
O querer ser Dr. e ter ficado pelo Sr. é motivo de grandes ressabiamentos para muita gente. Que ao invés de sentirem orgulho naquilo que fazem, sentem frustração por aquilo que não fizeram.
Mais um bom post. Parabéns!

Sahaisis disse...

Meu deus...como eu te percebo...

LadyBug disse...

Plenamente de acordo. Estou em Enfermagem e dos médicos apenas queria os trocados!

Lolinhos... (note-se que eu ainda não ganho! Estou apenas a estagiar, mas sei o que me espera.)

Mas adoro o que faço! :)

Beijitx*

Mike disse...

Antes de tudo nada contra os médicos. Tenho já alguns amigos na área, e apesar da muita escumalha lá existente, há sempre um ou outro que se aproveita.
Mas a verdade é que os aspirantes a medicina nunca podem olhar para a enfermagem como um mini-curso de medicina. Não faz sentido, porque as funções são muito diferentes, assim como as responsabilidades. Se quisermos ser pragmáticos, a medicina faz os diagnósticos e as cirurgias, enquanto que os enfermeiros tudo o resto. E este "tudo o resto" implica ter características pessoais que 75% dos médicos não têm, implica um trabalhinho duro e muita vontade. E já agora para aqueles que vêm a Anatomia de Grey, todas aquelas partes em que se vêm os internos a fazer aqueles diálogos "comoventes" com os utentes e a não largar o utente por um minuto parece-me mais trabalho de enfermeiro, pois nunca vi um médico a passar mais de 10 mins com um utente, excepto em cirurgia.
Mas percebo muito bem a perspectiva aqui do Miguel, porque eu à sua semelhança fui daqueles que caíram de para-quedas em enfermagem, mas aprendi a dar valor à enfermagem como poucos!

Anónimo disse...

Não tenho outros palavras a acrescentar ao teu post... Concordo plenamente com o teu ponto de vista e com a tua indignação.
Encontro na minha área - Psicologia - alguns frustrados que queriam ser chamados de Sr. Dr. e andar com um estetoscópio ao pescoço. Infelizmente, não aprendem a dar a devido importância ao trabalho de um psicólogo e a grande diferença que pode fazer no Serviço de Saúde, aos utentes e aos restantes profissionais de saúde.
Enfim, poderia alongar-me sobre o discurso "não existe recutamento de psicólogos porque não temos dinheiro para isso", mas existe sempre dinheiro para estádios de futebol ou afins... mas não é a temática que se discute!!!
Quanto a mim, adoro o que faço e na pessoa que sou graças à minha profissão...
(realmente sou chamada Dra., mas sem qualquer aspiração a médica..)