quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

"Less is more"

Julgo que, em algumas pessoas corre ainda o sangue dos nossos antepassados recolectores. Mas esta veia recolectora, de armazenamento evoluiu para algo diferente adaptado ao modo de vida moderno e sedentário. E penso que podemos distinguir dois tipo de sucedâneos dos nossos primos primitivos recolectores tribais: os "amontoadores" e os coleccionadores.
Os "amontoadores" são aquele tipo de pessoa que não só não é capaz de se ver livre de nada que esteja em sua casa como também não é capaz de dizer que não a uma oferta ou uma "pechincha", mesmo que nenhuma destas lhe faça particular falta. Estas pessoas nunca deitam nada fora porque "Pode dar jeito". Tenho um familiar que tem a garagem atafulhada de material absolutamente inútil e obsoleto desde aqueles rádios leitores de cassetes dos anos oitenta, antenas parabólicas, televisões a preto-e-branco, pneus de carros, ferramentas repetidas, esquentadores, etc, etc, etc. Muitos deles poderiam ser vendidos a lojas de antiguidades ou usados como objectos decorativos, para aquelas pessoas que pretendam um look retro em sua casa mas não! Nada daquilo pode ser mexido porque "pode dar jeito" num dia qualquer. O mesmo se passa com os amontoadores de roupa. Pessoas que, por mais roupa que tenham nos armários são incapazes de dar a roupa que já não usam! Porque nunca se sabe quando é que aquela peça pode ser necessária! Curiosamente, estas pessoas queixam-se sempre que não têm roupa suficiente. Na minha linha de trabalho porém, existe um "nicho" destes indivíduos que me diverte particularmente. Falo dos "ratos de congresso". Os "ratos de congresso" são aqueles profissionais que vão aos congressos apenas com o objectivo de conseguir o máximo de brindes da propaganda médica que lhes for possível! Desde canetas, malas de mão, cadernos, blocos de notas, borrachas, guarda-chuvas, suportes para telemóvel, pastilhas, rebuçados, fitas-porta-chaves, ratos de computador, calendários, tapetes para rato de computador, pins e alfinetes de lapela... podia estar aqui a escrever tudo aquilo que a propaganda médica oferece. É uma autêntica corrida ao brinde onde a regra é "quanto mais melhor". E, na próxima vez que estiverem num hospital ou centro de saúde tentem reparar na quantidade de canetas que as enfermeiras (sim, as meninas são piores!) trazem na lapela... Portanto, os amontoadores armazenam coisas mais ou menos dispensáveis como as formigas armazenam comida para o inverno!
Os coleccionadores por outro lado são mais selectivos. Seleccionam um e apenas um objecto e armazenam o maior número possível de exemplares desse objecto. De sublinhar que um coleccionador ostenta com orgulho e destaca a sua colecção de objectos! Se eu até compreendo o argumento dos "amontoadores" de que "pode dar jeito", já me custa mais a entender os coleccionadores. Qual será o objectivo de coleccionar caricas, ou latas de refrigerantes? Para a maioria das pessoas estes objectos são lixo, depois de usados! E as colecções mais sérias como selos, moedas, carrinhos em miniatura, barcos dentro de garrafas, etc? Qual a utilidade disso? Já não falando de colecções que considero como sintomas de uma qualquer condição mental psiquiátrica como ementas de restaurantes, prendas e convites de casamento (mesmo que não se tenha sido convidado), pedras, cigarros, copos roubados de bares ou chávenas de café surrupiadas, colheres, etc, etc, etc...
Imagino sempre uma conversa deste tipo, num bar:
Coleccionador: Olá jeitosa! Posso oferecer-lhe uma bebida?
Jeitosa: Ui... olá homem bem parecido e atraente! Para mim um malte...
Coleccionador: Mas que bem parecida que a menina é... aposto que é instrutora de fitness. Eu sou empresário.
Jeitosa: Oh, obrigado! Mas não, sou secretária... Então e o que faz tão distinto homem nos tempos livres, para além de andar a engatar miúdas em bares duvidosos e usando frases de engate muito fraquinhas?
Coleccionador: Ora essa! Eu colecciono caricas e adoro passar horas a puxar-lhes o brilho e a dispo-las ordenadamente por ano de aquisição e por um elaborado código de cores que só eu descodifico! Gostaria de passar por minha casa para ver como desfiz cuidadosamente a curvatura causada pela abertura da garrafa devolvendo assim à carica a sua forma mais bela?
Jeitosa: Filho, eu posso estar desesperada mas tenho padrões mínimos. Adeus.
Numa palavra: deprimente.

3 comentários:

Claudia disse...

Ola! Acho as suas estorias interessantes e costumo visitar esta pagina com alguma frequencia. Em relacao aos coleccionadores, eu colecciono moedas e vou explicar o que me leva a faze-lo. Esta e uma coleccao que o meu pai iniciou e de desde pequena me despertou curiosidade por causa dos nomes-muitos deles por se tratarem de moedas estrangeiras nao conseguia ler- e depois pelas figuras. Isso fez com que me interessasse por geografia e tambem por historia desde muito pequena, era um prazer tentar descobrir de onde vinha aquela moeda, onde ficava o pais e quem era a figurinha (muitas vezes rei/rainha/ ou outra figura de destaque do pais). Acho que e uma forma divertida de estimular o estudo. Hoje em dia ja nao sou tao pequena mas continuo a gostar imenso de continuar a coleccao e descobrir ilhas como vanuatu ou tuvalu, pegar no google e ler mais acerca....alem disso ha sempre o valor material das moedas. Acaba portanto por ser um investimento tanto do ponto de vista material-com os anos a coleccao valoriza-como tambem acaba por ser um investimento em cultura geral. :) Bom trabalho!

Miguel disse...

Cláudia, obrigado pela partilha!!
;)

Melissa disse...

E há ainda as pessoas que fazem clisteres à própria casa, que sou eu e a Anacê - mais eu do que a Anacê.