sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

Mais um momento perfeitamente escusado de crítica literária.

Sempre fui, abertamente, um defensor do Saramago. Fiquei do seu lado na polémica pré-lançamento de "Caim" e considerei que saiu vencedor no debate com a Igreja. O que eu admiro em Saramago, mais do que a escrita, são as premissas que originam os seus romances e a argúcia com que ele faz uma certa crítica social nos seus livros. Não os li todos, mas li bastantes para apreciar a sua obra. "Caim" é um flop. Uma mera forma de ganhar uns trocos para pagar os cuidados da velhice. Uma obra escrita à pressa.
Mas, pior que tudo isso, afinal o homem pode fazer "render o peixe" da maneira que entender, é que "Caim" trai todo o espírito saramaguiano na medida em que, em vez de ser uma crítica bem elaborada e estruturada e com um ponto de vista diferente mas legítimo (como o foi "O Evangelho Segundo Jesus Cristo" que conta uma história sobejamente conhecido através de um ponto de vista diferente mas perfeitamente legítimo), trata-se antes de um exercício de sobranceria e arrogância do autor sendo mesmo ofensivo em algumas partes.
Em "Caim", Saramago aproveita o desterro a que Caim foi votado por Deus após assassinar o ser irmão Abel e imagina uma viagem que o leva a testemunhar alguns dos actos mais sanguinários descritos na Bíblia, desde o dilúvio do qual só sobreviveram Noé e a sua família e animais, passando pela destruição da torre de Babel e pelo genocídio ocorrido em Sodoma. Acontece que estes eventos não ocorreram na mesma época em que viveu Caim! Calculo que Saramago seja um grande fã da série "Lost" porque acontece a Caim exactamente aquilo que acontece às personagens perdidas na ilha durante toda a 5ª temporada (quem não viu que se informe porque eu não quero estragar a expectativa a ninguém)! Depois há muito sexo com sémen espalhado por várias partes do corpo da mulher, há violência gratuita sempre vinda da parte de Deus, que a propósito, é um sacana sem lei da pior espécie, um déspota que retira prazer do sofrimento humano e até os anjos são meros funcionários manietados por esse crápula, discordando dele à boca pequena.
Eu não sou de todo cristão, nem católico, nem de outra religião qualquer mas respeito. E, agora sim, depois de lida a obra, a Igreja tem argumentos para atacar o velho sabichão do Saramago. Em primeiro lugar porque a narrativa do livro é imensamente rebuscada e depois porque, enquanto obra de relevo, "Caim" é muito fraquinho.
Ó Saramago, não havia necessidade.... (mas, mérito seja reconhecido, safaste-te bem nas vendas durante o Natal, hmmm?)

4 comentários:

Ana C. disse...

Em grande Miguel :)
Gostei muito deste texto, mas bastava-me ouvir as idiotices que ele andou a dizer aquando do lançamento do livro para perder toda a vontade de virar sequer uma página dessa baboseira-caquético-que-já-nem-ofende-ninguém-apenas-mete-dó.

TIA COMPLICAÇÕES disse...

O único livro que tentei ler foi o Memorial do Convento,para ajudar o meu filho num trabalho escolar, é uma seca, não passei do primeiro capitulo. O miudo safou-se foi à net tirar o resumo do dito livro. Lia uns parágrafos , voltava atrás, aquilo não fazia sentido nenhum, nem com dicionário lá chegava......o senhor Saramago ou está senil ou subiu-lhe a intelectualidade à cabeça.....não sei como alguém consegue ficar prendido a uma leitura daquelas e a pontuação, nem vê-la ....ainda não falei com ninguém que gabasse o prémio nobel da literatura ...devo ser muito burra, resta-me a satisfação de saber que não sou a única.....

Serendipity disse...

Sou fã do Saramago há algum tempo, já li vários livros dele que gostei muito e adorei este de igual forma. Admito que foi ofensivo em algumas partes, completamente desnecessárias (aliás, ele próprio acabou por admitir isso em debates e entrevistas). De resto, considerei uma sátira muito bem construída acerca da Bíblia que, por interpretada à letra analisando tal e qual o que está escrito, tornou-se, a meu ver, hilariante...

Mas enfim...são perspectivas diferentes. Se todos gostassemos do mesmo seria um grande problema :)

Ana. disse...

Eu só o vou ler daqui a um ano ou dois, quando a poeira assentar e puder avaliar o texto sem interferências.

Já tentei ler vários livros de Saramago e nenhum me prendeu. Como me recuso a ler por obrigação (para isso basta o trabalho) nãi cheguei a acabar nenhum!

Será o Caim, o primeiro que acabo?

;)